terça-feira, 30 de junho de 2015
qualquer coisa a mais
"(...) nos dias das avaliações havia qualquer coisa a mais, um excesso de tagarelice, uma demonstração exagerada de ternura pelos filhos, um tom de voz artificial e festivo, com notas demasiado altas e vibrantes, que a intuição da velha dizia que só podia ter uma origem intrinsecamente má".
gente melancolicamente louca, Teresa Veiga, p. 158
Jornal i #28 Incapacidades do PS
Hoje, para o jornal i:
Caro
leitor, apesar das atenções centradas em Atenas, chegou a altura de
reconhecermos o esforço colossal do PS. Refiro-me, em concreto, ao esforço de
coerência revelado nos últimos tempos. Eu explico: António Costa, essa
esperança audaz (ou será mendaz?), dependendo do dia, da semana ou mesmo do
mês, já se referiu ao Syriza sob diferentes perspetivas que oscilam entre “uma
linha a seguir” e uma atitude “tonta” perante a UE. No meio de tanta
contradição, a semana passada, no dia 25 de junho, o PS Porto organiza uma
manifestação contra a austeridade e chantagem em apoio do Syriza.
É
surpreendente como a nadar em tanta vacuidade o PS concentra os seus esforços
em manter alguma coerência. A dura realidade é que, a poucos meses das
legislativas, o PS está ideologicamente perdido. Num partido que se apresenta
como alternativa séria de governo, a sua incapacidade de tirar as devidas
consequências das suas diferenças com o Syriza é assustadora. Este marinar
ideológico confirma a improbabilidade de um candidato, estruturalmente
socialista, ao tentar desafiar o consenso ideológico politicamente correto
socialista/social democrata, desenvolver um programa e um léxico alternativo,
neste torpor europeu pós moderno, e com isso beneficiar de uma votação de
proporções históricas. O PS é, por isso, um partido sem fôlego, ideologicamente
falido, historicamente comprometido com o presente, e incapaz de suportar um
debate que não assente num jogo de cintura entre a coerência e a contradição.
segunda-feira, 22 de junho de 2015
Jornal i #27 A praga do politicamente correcto
Texto publicado a semana passada no jornal i:
Jerry
Seinfeld, sem papas na língua, colocou o dedo na ferida: "O politicamente
correto [curiosamente, PC] está a dar cabo do sentido de humor". Refletindo
sobre o estado atual da comédia, Seinfeld alerta para o perigo da ditadura do
PC que, passo a passo, está a limitar o discurso artístico das sociedades
modernas, estando particularmente ativo entre os membros mais radicais da
academia e seus discípulos. Assim, consequentemente Seinfeld declarou que
deixou de fazer stand-up em universidades. Segundo Seinfeld, os jovens não
sabem o que palavras como "sexista" realmente significam, "Eles
(jovens da academia) apenas querem usar estas palavras: Isto é racista, Isto
é sexista, Isso é preconceito". Este perigo que afecta grandemente as
liberdades dos comediantes, impedidos que ficam de usar certas expressões ou
refletir, ainda que de forma descontraída, sobre questões de género, raça,
religião ou orientação sexual; em breve condicionará toda a criação artística.
Definir esta praga nem sempre é fácil,
mas Theodore Dalrymple explica que é a tentativa de reformar o pensamento
tornando algumas coisas indizíveis e, ao invés, usando um vocabulário
purificado e de sentimentos humanos abstractos. É, no fundo um mix entre
covardia, má informação e preocupação com a imagem que conduz as sociedades
modernas a esta capacidade de produzir ofendidos profissionais. Chegará o dia
em que Hollywood se verá obrigado a produzir apenas comediantes
politicamente corretos, nesse dia a comédia será apenas mais um defunto do século
XXI, a par da liberdade de expressão.
terça-feira, 16 de junho de 2015
terça-feira, 9 de junho de 2015
Jornal i#26 A ética do caracol
Hoje, para o jornal i:
"Bem, caro leitor, chegou a hora de debatermos os direitos dos frangos, dos porcos e das vacas (não vá alguém acusar-me de machismo animal…). Estou certa de que chegaremos aos piolhos e ao direito das alfaces de fazerem fotossíntese ad aeternum. Aliás, é inevitável, uma marca de progresso, diria mesmo, depois da campanha lançada a semana passada pela Associação Directa em defesa dos caracóis.
Além de inevitável, é lamentável. As raízes destas pretensões remontam a 1975 e a um livro de Peter Singer, “Animal Liberation”. A tese é simples: os animais são gente porque sentem dor. Bem, concordo que torturar animais é errado, ainda que grande parte da vida animal seja vivida sob tortura de alguns seres para que outros possam viver. Mas o grande mal deste grupo de “conscientes” é a incoerência. No limite, estas pessoas defendem que não se deve matar nenhuma forma de vida, esquecendo que a natureza é a maior destruidora de vidas desde sempre, sem pena dos fracos, dos oprimidos, dos bovinos e dos suínos. E não acredito que Singer proteja os acarozinhos, coitadinhos, quando anda a aspirar a sua casa.
Roger Scruton explica o happening num livro “Animal’s Rights and Wrongs”, com base na religião: o homem, criado à imagem e semelhança de Deus, não acredita ser o ser superior da criação, por isso reconhece – do alto da sua superioridade, veja- -se – “direitos” e “dor” nos animais. Quanto a mim, a ideia de um discurso em torno dos direitos dos animais separado da pessoa humana parece-me uma tolice teórica."
sábado, 6 de junho de 2015
o grande vazio
diapasão, tão, mas tão genuíno, da dor e solidão que existe dentro de nós. É isso que Somewehere (2010), de Sofia Coppola é, ainda que hiperbolizado.
quarta-feira, 3 de junho de 2015
selo
chegou ao espelho onde antes, ninguém, nem mesmo ela, se via.
e viu o tamanho do selo sobre o corte do seu peito
agora já disponível para amar.
e viu o tamanho do selo sobre o corte do seu peito
agora já disponível para amar.
terça-feira, 2 de junho de 2015
jornal i #25 O regresso da velha forma de fazer política
Hoje, para o jornal i:
Na semana em que um estudo revela a captura do Hospital Santa Maria por uma certa tendência religiosa, o primogénito do Dr. Marinho e Pinto é tomado de assalto por uma multidão alegadamente ligada a uma certa igreja. Há, porém, que sublinhar a diferença: não haja ilusões, Marinho e Pinto é o líder incontestável do PDR - o partido da ideologia “pimba” que pretende ser um case study sobre os limites da indefinição esquerda/direita - e nenhum ato formal, interno, pretensiosamente democrático, do partido mudará o seu status. O relato é glorioso: “dirigi-me à presidente da mesa e mandei suspender”, é assim que o Deus ex machina partidária Marinho e Pinto, regressado, triunfal, à pátria, vindo da Europa, explica o contra tempo. Ora, para quê ter um presidente da mesa se ele pode mandar no ato eleitoral? (honni soit qui mal y pense…)
Na semana em que um estudo revela a captura do Hospital Santa Maria por uma certa tendência religiosa, o primogénito do Dr. Marinho e Pinto é tomado de assalto por uma multidão alegadamente ligada a uma certa igreja. Há, porém, que sublinhar a diferença: não haja ilusões, Marinho e Pinto é o líder incontestável do PDR - o partido da ideologia “pimba” que pretende ser um case study sobre os limites da indefinição esquerda/direita - e nenhum ato formal, interno, pretensiosamente democrático, do partido mudará o seu status. O relato é glorioso: “dirigi-me à presidente da mesa e mandei suspender”, é assim que o Deus ex machina partidária Marinho e Pinto, regressado, triunfal, à pátria, vindo da Europa, explica o contra tempo. Ora, para quê ter um presidente da mesa se ele pode mandar no ato eleitoral? (honni soit qui mal y pense…)
Este
momento da história do PDR, essa sinistra invenção revivalista que nos lembra o
tirânico Costa - o Afonso, obviamente -, é uma demonstração de que, tal como os
gauleses de Goscinny, o nosso sistema partidário é incorrigível e o PDR,
afinal, não é verdadeiramente diferenciador: já andam todos às avessas e ainda
a procissão vai no adro. Este caso, em particular, reflete um clima
antidemocrático e um sentimento de hostilidade ao confronto. Para Marinho e
Pinto o adversário (no caso Alexandre Almeida) nem devia existir na pureza do
ato eleitoral. Para nossa infelicidade lusa, com democratas destes ninguém
precisa de ditadores.
segunda-feira, 1 de junho de 2015
dupla real
Ao ler esta peça do Daily Beast sobre a personagem interpretada pela Dame Diana Rigg em Game of Thrones, lembrei-me de outra Dame com papel destacado noutra "série de culto", Maggie Smith em Downton Abbey. Curiosa a mesma postura matriarcal, serena e conspirativo-manipuladora destas duas cultoras da subtileza. O que dirá a gritaria feminista sobre a importância e a elegância destas duas figuras em tramas com graus ficcionais tão distintos, hein?
(esclarecimento: em questões destas eu não teria dúvidas e o meu voto iria, obviamente, para a Dowager Countess)
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