Da sociologia ao direito, há hoje um consenso alargado sobre a importância e a necessidade original de instituições na vida humana e na forma como se organiza essa vida em sociedade.
É a existência de instituições na vida quotidiana, no dia-a-dia, que nos facilita um contexto organizado, uma ordem, direção e, sobretudo, estabilidade. Confiando nesta estabilidade, aos poucos vamos elaborando os nossos planos de vida, os nossos projetos de felicidade. Não é do nada que, num regime democrático, o regular funcionamento das instituições é um pressuposto (até constitucional) da sua sustentabilidade e um sintoma da sua saúde.
Posto isto, com alguma preocupação ficámos a saber, através de um estudo da DECO, que os portugueses não só não conhecem como não confiam nas instituições nacionais e internacionais que os governam e representam. Esta constatação coloca as instituições do nosso país numa posição particularmente frágil e vulnerável, indesejada numa democracia saudável. Não é de estranhar, dirá imediatamente o leitor. Sendo difícil identificar no tempo e no espaço as raízes deste descontentamento, seguramente que o comportamento menos exemplar de alguns dos órgãos que as constituem é um elemento a incluir na análise e compreensão do fenómeno.
Basta pensar num dos acontecimentos que marcou a vida política nacional na semana passada: a conflituosidade institucional suscitada pelo facto de a presidente do Conselho de Finanças Públicas (CFP), Teodora Cardoso, ter dito que foi quase um milagre o governo ter conseguido um défice de 2,1%. Surpreendeu, desde logo, a participação neste episódio de um Presidente da República sempre tão preocupado em atenuar o “clima de crispação”. O que já não surpreende é o exercício de defesa cega dos resultados do governo do PS, refletido na advertência de um deputado comunista à presidente daquele órgão: “Milagre é Teodora Cardoso ainda ter salário e ocupar o lugar que ocupa.” Recorde-se que, além de uma economista de respeito e que, no caso, está coberta de razão, o Conselho ao qual preside é um órgão independente e autónomo do poder político que tem por função fiscalizar as finanças do Estado.
Tempos houve em que a esquerda parlamentar, então impoluta e menos comprometida, censurava aqueles que discordavam do conteúdo das decisões de órgãos autónomos e independentes do poder político, como sucedeu com as decisões do Tribunal Constitucional, cuja independência política não é totalmente incontestada, e a sua designação de “tribunal” nem sempre consensualizada. Como reação natural à deslocada referência da presidente do CFP a um “milagre” esperava-se uma discordância dentro dos limites que impõe o respeito institucional e a autonomia do órgão: uma discordância de substância, devidamente fundamentada, e nunca uma espécie de ameaça à pessoa que exerce o cargo ou um ataque à sua competência ancorado na mera discordância entre o PCP e a realidade económica apontada por Teodora Cardoso. Porém, bem vistas as coisas, não é novidade nenhuma o desprezo olímpico do PCP por instituições autónomas de supervisão e controlo do Estado.
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