sexta-feira, 26 de agosto de 2016

delegação


HT: Why don't you use a cellphone?

WH: For cultural reasons. I’m not nostalgic, but I like to maintain contact, like, with you, directly sitting across a table.

I'm not delegating my examination of the world to, let’s say, applications. I like not being available all of the time. And, at the same time, I like knowing that no hacker or no hostile government could track me down. Now I’m sitting in this hotel in this room for how long. And they would know with whom I’m speaking and how many minutes. Nobody knows where I’m sitting, with the exception of you.

Excerto da entrevista de Werner Herzog aqui completa.

juro que "cá" cheguei através de um episódio dos Sopranos (5)







quinta-feira, 25 de agosto de 2016

a matemática da vida

com um sentir de gratidão, corro os olhos pela minha infância para tentar contar as vezes que a minha Mãe, de forma serena e paciente, me repetiu as normas e padrões educativos que me quis transmitir. Será que encontro nesse número a quantidade de vezes que, por estes dias e nos próximos que hão-de vir, lhe repito as novidades da minha vida adulta que a sua memória, já gasta, não lhe permite reter?

A vida, por vezes, tem uma geometria irónica.

domingo, 21 de agosto de 2016

Camilo hoje

"Estamos em vida fictícia como país independente. Somos como o sapateiro que se veste de príncipe no Entrudo. Pois bem! Comédia geral! Seja Portugal um teatro desde Monção ao Cabo da Roca!"

A Queda dum Anjo, Camilo Castelo Branco, p. 34 

terça-feira, 16 de agosto de 2016

Jornal i #74 - A burla fundamental do comunismo


Depois de uma pausa para férias voltei ao i,

Ates destas férias assisti a alguns filmes do realizador russo Nikita Mikhalkov que passaram no cinema Nimas, em Lisboa, entre eles “Burnt by the Sun” (1994) cuja tradução para português (“O Sol Enganador”) se revela hedionda à medida que se desenrola a narrativa, num momento histórico muito preciso na Rússia: um domingo de 1936, aparentemente idílico, sereno, bucólico, cheio de reminiscências de Tchekhov, mas que coincide com as purgas de Estaline, às quais não escapará o herói principal, o coronel Sergei Petrovich Kotov, um antigo cão de fila do próprio Estaline. 


É o próprio Mikhalkov que assume o papel de Kotov, um indivíduo cuja esperança no seu país, na glória da revolução e do comunismo são inabaláveis. Essa sua convicção é-nos contada numa cena inesquecível num passeio de barco com a sua filha Nadia, em que Kotov, com um entusiasmo doce e ingénuo, uma voz persuasiva e um pouco melíflua, explica à menina que o poder soviético e a revolução trarão progresso e vantagens materiais várias, dos sapatos aos transportes, fazendo da URSS um paraíso moderno de felicidade e bem-estar.

A sua descrição, manipulada por uma fé cega, quase é convincente, não fosse a história ensinar-nos que todas as tentativas artificiais e não espontâneas de alcançar a felicidade, todas as promessas de certas utopias têm redundado em fracassos. Afinal, parece que utopia significa um “lugar que não existe”, e não “um lugar agradável”. 

Este é um filme sobre o momento exato em que o comunismo de ideal se transforma em pesadelo, vitimizando todos quantos foram “queimados” pelo sol da revolução; um filme que retrata uma traição ideológica, uma burla fundamental de quem se permitiu acreditar num ideal que é, pela sua natureza, vulnerável a uma decomposição imediata, e que, se verdadeiramente existiu na sua pureza, morreu algures no passado, restando apenas a realidade dura e crua de um futuro incerto mas fatal. Creio que foi Agustina Bessa-Luís quem escreveu: “Tudo o que é excessivo se compreende logo.” Pelo menos, devia ser assim.