terça-feira, 8 de dezembro de 2015

Jornal i #46 - Quanto sabe o Facebook sobre si?



Leio que “o Facebook (FB) é o site onde os europeus mais querem ser esquecidos”. Faz sentido sobretudo para os que conhecem Max Schrems que, em 2011, exigiu ao FB conhecer todos os dados recolhidos sobre si. Dois anos e uma batalha judicial mais tarde, o FB entregou-lhe 1200 páginas (!) contendo uma radiografia da sua actividade, dos seus gostos, das suas preferências, amizades, conversas, incluindo todas as localizações, computadores e gadgets em que acedeu ao FB.

Também a Google, à qual não mentimos e fazemos revelações mais íntimas do que à família, amigos ou mesmo ao padre, sabe se pensamos participar numa manif, se queremos fugir aos impostos, onde queremos jantar ou viajar, ou qual o cantor da moda que secretamente galamos. A Google é mais conhecedora que muitas possessivas e dedicadas esposas. Seguramente, sabe mais sobre mim do que eu, já que grava memória de tudo o que pesquisei desde sempre. E, se o leitor assistiu no YouTube a filmes menos recomendáveis, a Google sabe, e não se espante se, depois de uns minutos de visionamento furtivo, receber um sugestivo email propondo-lhe “enlarge your penis”. Tudo foi facilitado por uma política de “privacidade” implementada em 2012. E este “perfil” que a Google constrói sobre nós, com base nas interacções digitais a que tem acesso, é distinto da representação que apresenta a terceiros sempre que nos pesquisam – e é apenas aí que actua o “direito a ser esquecido”.

O tema é tratado como um problema de privacidade e de liberdade de expressão. Mas as implicações são também para a identidade pessoal, entendida como um processo dinâmico de (re)construção sobre o qual devemos ter controlo, se não absoluto, pelo menos parcial. Desse processo faz parte a possibilidade de, querendo, sermos diferentes de nós mesmos: de evoluirmos, de melhorarmos, de fazermos ruturas com algo na nossa personalidade passada, que decidimos alterar; ora, todas estas possibilidades da “memória digital” ilimitada ferem gravemente essa nossa esfera de domínio e controlo individuais. Afinal, quem quer ser recordado em 2015 que no ano 2000, a caminho do liceu, trauteava a letra de “Baby One More Time”?

Hoje, para o i.

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